terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Re-cor-tes

Madrugada afora
Sentada nessa cadeira
Me recortando
Por dentro e por fora
Esperando por uma resposta
Que simplesmente não vem
Com aquela famigerada voz de dor de estômago
De um roqueiro deprimido qualquer
Tentando recortar um verso qualquer
Que saiba dizer melhor do que eu
A agonia de recortar meus sentimentos
Os seus
Na esperança de juntar alguma coisa em mim
Que me faça melhor
Do que ser só esse recorte
Que sente
E se corta

domingo, 27 de setembro de 2009

Dominguices

Vi um filme triste, fiquei triste e não quis dividir. Comprei chocolates só para mim. Quis que fulana voltasse e beltrano parasse de me incomodar. Tive ciúmes de quem jamais pensei em conhecer. Me aborreci com o ciúme de quem desisti tentar conhecer. Jamais vou entender as atitudes de ciclana, mas não pretendo deixar de gostar dela. Não vou me esquecer que “o coração dos outros é terra que ninguém anda”. Troco os nomes dos bois para evitar a rotina e sofrimento. Tenho amor, preciso saber a quem dar. Me confundo com datas, agendas e desejos. Desejo muito, controlo o que posso. Um peso para cada medida. Excesso de proteção é a qualidade que mais me dói. Hoje fui dormir sem saber a quem vigiar.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Pródiga

Eu me cubro até o último fio de cabelo de mau humor e raiva
Pra me explodir sozinha e me desmanchar com lágrimas e soluços que não são meus
E me mato de culpa.
Simplesmente por não enxergar o óbvio.
Mães sempre serão mães.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Rush time

E o que faz mesmo a diferença é ser indiferente. A vida de quem quer ser prático, pra se adaptar à realidade. Tempo curto, café pequeno, passos contados, contas, trabalhos, concursos, emails, carreira, supermercado, problemas, amigos, trânsito, enfim.

No meio das vírgulas, das entrelinhas, do subconsciente que seja, ainda existe vida, mesmo que não haja espaço suficiente entre o cartão de ponto e o semáforo pra saber dizer o que ela é.

E quem ainda não aprendeu a regular o despertador pra “vida de adulto século XXI” vai ter um pouco mais de dificuldade pra saber como são os sentimentos na versão 2.0. Não interessa se vocês tem interesses em comum. Não interessa se a química é perfeita. Não interessa se vocês tem vontade de ligar um para o outro no fim de semana. As relações não tem nome. Não tem data de início. Todo mundo começa dizendo que não quer nada, assim fica mais fácil sair sem ter que pedir a conta.

Fácil, simples, prático. Não se apegue a ninguém. Não ultrapasse a barreira dos beijos, sexo e sensações. Não goste de ninguém a mais do que o limite racional. Não faz bem pra agenda.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Quero verão no meu inverno

Ainda não terminei meu colar de contas
Ainda não terminei de ver o sol ir embora
Não vai ainda não
Não vai que eu ainda não desisti
De acertar o açúcar do seu café
Não vai que ainda tem preguiça de sobra nessa rede
Não vai que ainda tem sal na sua roupa
Não vai que minha bermuda ainda cheira a cloro
Não precisa se despedir
Não precisa fazer drama pra dizer que precisa ir
Não precisa dizer que gostar vai te fazer doer
Não precisa dizer ainda que o nosso bem faz mal a você
Deita aqui
Esquece de falar, continua a me abraçar
Não pense no que eu penso
Eu te olho nos olhos com minhas mãos em seus cabelos

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Lençol

Eu vou misturar dois corpos num só
Mas vou manter à parte um coração
Eu vou deixar uma alma “in vitro”
Para dois corpos se gostarem em paz
Eu vou deitar os pés no lençol
Como quem põe os pés firmes no chão
Eu vou deixar o amor ao lado de fora
No frio rude
Que mais tarde ele me agradece
E dorme em paz em leito seguro.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Gerúndios

O pior de tudo são as repetições. E as poucas perspectivas visíveis.  Tudo fica mais difícil de progredir porque eu estou sempre te repetindo, te diluindo, te reproduzindo em meus pensamentos. Vagos, como sempre. É uma linha contínua com uma força oposta. Eu olho para frente, mas sigo para trás. O problema é você estar no gerúndio. O vazio que limita um parágrafo do outro é mais ou menos parecido com a tal distância entre o número um e o número dois de que a Lispector falou certa vez. 
Eu não tenho fotos suas, não tenho seus gostos favoritos, não tenho suas manias, nem as coisas que você gosta de comer quando acorda. Não tenho nada dessas pequenas coisas que nos prendem a alguém. Mas tenho saudades. E é isso que eu não digo aos quatro cantos, mas é o gerúndio que carrego dentro de mim. O tempo vai passando e eu permaneço te repetindo. A vida vai andando e continuo te esquecendo, é por isso que eu nunca te esqueci. 

domingo, 19 de abril de 2009

Desabafo

Perder você foi duro pra quem sempre achou que nunca teve nada a perder. A gente percebe que tem alguém por um suspiro. Pelo cheiro que fica impregnado na alma. Pela sensação do toque que fica depois de ter conhecido tantas mãos. 

Eu vi outros olhos. Eu senti outros sentimentos. Eu passei por todo um buraco negro indecifrável chamado outros. E foi só você quem ficou. Foi só seu gosto que parou na minha boca. Foi só a sua vontade que prevaleceu na dos outros. Só teve um telefone que eu quis discar e nunca tive coragem. Assumir que te quero dói.

Hoje eu não acordei com vontade de ignorar a presença da sua ausência.  Ta na hora de admitir pra mim mesma que sinto mesmo a sua falta, pelo menos para aliviar um pouco essa respiração sufocada. 

Esse nó na garganta que fica toda vez que tento transformar minhas lembranças em apenas uma casualidade qualquer. Que não seja para me enganar, mas volte. Pra dizer qualquer coisa que seja. Eu só preciso de um rastro que não seja a incerteza que ficou quando você quis ir.

 

 

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Surdez

Eram dois surdos rompendo no metrô. O trem sacudia, chiava nos trilhos, as pessoas reclamavam e uma lágrima de canto escorria. Um olhava para o outro com dor. Ora os olhos passeavam pelo chão, ora fitavam a janela, quando ganhavam coragem, fitavam uns aos outros ou o movimento das mãos, que gritavam.

Ao redor, o que as pessoas ouviam eram reclamações do cotidiano, celulares tocando, adolescentes fazendo baderna depois da aula. Mas era no silêncio que dois corações se partiam. Uma cena de novela, encenada por gestos. A separação a quatro mãos, o soneto mais triste que dois poetas de uma realidade silenciosa fizeram.

Um dizia ao outro coisas terríveis. Um implorava ao outro que fosse diferente. Um jogava na cara do outro que talvez fosse melhor nunca terem se cruzado na vida. As mãos as vezes tremiam.

Em uma estação perdida, ela desistiu de suportar o peso da discussão e resolveu descer. No calor de uma discussão abafada pelas inutilidades rotineira dos passageiros, deixou escapar um soluço, um único sinal sonoro de toda a tormenta. 

E ele se virou para a janela para dizer adeus, ainda com uma lágrima escorrendo pelo mesmo canto do olho. Já não dizia mais nada com as mãos. Os corações soluçavam, dentro e fora da estação, sem dizer uma palavra sequer. 

quinta-feira, 5 de março de 2009

O nome da dor

O  nome da dor é mutável. As vezes morte. As vezes ausência. As vezes presença. As vezes excesso. O nome da dor não existe, só a dor existe de verdade. E é incrível imaginar como algo que arde tão verdadeiramente seja impossível de dar nome e de tocar. Há alguns minutos me ocorreu uma frase que pra mim é uma verdade óbvia: Não preciso ver o que me machuca pra saber que dói.

É por isso que achar que se afastar de alguém seja remédio para alguma dor não passa de uma tremenda ilusão. A dor da morte só deixa de ser dor quando a saudade resolve se contentar em viver numa batida de coração menos sufocante e encontra conforto na casa das boas memórias.

A dor de um amor não sabe se travestir de outra forma. A não ser que o próprio coração encontre outros métodos de sobrevivência, não é o afastamento que será capaz de destruir a autoridade de uma força tão poderosa. Ninguém morre de amor, essa é justamente a pior tortura da dor. Fazer com que você viva a cada dia lembrando que sofre com a presença dela. Latente.

Ainda bem que alguém foi sábio o suficiente para escrever um dia que “a tudo a gente se habitua”. Inclusive por ser massacrado por si próprio a cada dia.

Se ilude quem pensa que trocar um lençol pode fazer a gente parar de sentir o cheiro de quem não deita mais ao nosso lado. Mudar rotas, telefones, ambientes, tudo isso é inútil.

Os lugares não mudam de lugar na nossa memória.

A saída é viver. Do jeito que está mesmo. Doendo. Quem não dói? Não sei. Acho que nem os mortos escapam desse martírio. Vai vivendo, vai doendo. Até que o hábito de conviver com a dor te faça perceber que ela já não é tão grande quanto era no início....

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Porta de entrada/saída

Você pode tentar (e até conseguir) amá-las
Você pode se agarrar a seus gostos, seus sons
Você pode aprender a falar a língua delas
Você pode amarrar as palavras delas às suas
Você pode dormir com elas
Ou desejar tê-las mesmo que em sonho
Você pode possuí-las por completo por alguns instantes
Desde que não se esqueça que não poderá nunca, jamais
Segurá-las para sempre
Guarde uma foto e um cigarro no fundo do maço
Elas vão te amar e fazer você amar
Mas elas sempre vão se enraizar no vento

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Wilson Ranieri

Ontem eu gastei mais ou menos uns vinte minutos do meu tempo pra assistir um programa de moda. Alternava entre este e o canal de mesa redonda sobre futebol mineiro. Não vou saber (e nem pretendo) porque fugi tanto dos meus hábitos naquela tarde, que apesar de tão nublada, não me incomodou tanto. Eu já consegui me incomodar o suficiente com meus pensamentos nublados.

E talvez pro tempo não fechar ainda mais para minhas paranóias, decidi prestar atenção na dita “dramaticidade-leve-e-feminina” da coleção outono-inverno de Wilson Ranieri. E daí a vibe de versão acústica de “Toxic”, aquela cara de pessoa tímida e cheia de idéias e o propósito de traduzir o cotidiano em tecidos finos e rostos esbranquiçados, lindos e tristes, me puseram pensativa.

A vida da gente segue assim, quando fica em silêncio. Prefere dispensar o alvoroço e as cores excessivamente vibrantes do verão, que normalmente servem para realçar a necessidade que pessoas mal resolvidas têm de mostrar para o mundo que estão bem.

Não é que a leveza dramática de Ranieri seja mau sinal. Mas sou mais adepta a esses olhares simplistas sobre a realidade. As mulheres de Ranieri se vestem com tons pastéis e desfilam ao som melancólico de uma impossível Brtiney Spears acústica. São mais próximas das mulheres que tomam café num fim de tarde pensando no que deixaram por fazer no trabalho e no que está por fazer em casa. Das que acordam enjoadas porque sabem que vão menstruar. Das que seguem para o almoço com a amiga e para o dentista com o coração meio sofrido, meio calado de ciúmes de alguma ex que apareceu pra atormentar a relação. Ou até mesmo das que não têm coragem de perguntar a caminho do cinema a dois quais são mesmo as intenções daquela aluna nova, toda pra frente.

As mulheres leves e dramáticas daquele desfile são as que sustentam o peso da realidade com classe. Com a alma bem vestida. E ainda que eu não passe 24 horas de todos os meus dias agindo como uma delas, em um dia de muita alegria preferiria usar um daqueles vestidos com as alças assimétricas e estampas discretas. Não por achar que a felicidade não seja digna de cores mais fortes, mas pra fugir desse maldito clichê de sair gritando felicidade por ai. Quem grita felicidade não é feliz de verdade. Expor felicidade em excesso é fada-la ao fracasso. Estampas discretas são mais sensatas.